domingo, 27 de janeiro de 2019

Azulejaria carioca



Carioca do Catete, Athos Bulcão 
marcou a arte e a arquitetura do país,
inspirando gerações de artistas e ceramistas.

O gênero é antigo e atravessou o oceano junto com colonizadores que ficaram ou passaram pelo Rio. Não é difícil encontrar pela cidade belíssimos conjuntos de azulejaria com origens portuguesa ou francesa, para citar alguns exemplos. Da tradição à contemporaneidade, no Rio há lugares onde os azulejos são protagonistas e contam histórias. Metros quadrados de uma arte secular, nas paredes de museus e centros culturais, ou mesmo nas ruas, onde, junto à estética urbana, resistem ao tempo.



Aluísio Carvão

Painel de azulejos de Aluísio Carvão, na Rua Mário Ribeiro: cores e formas geométricas Foto: Laura Marques / Agência O Globo
Ícone do movimento neoconcreto que ganhou força no final da década de 1950, o artista paraense Aluísio Carvão (1920-2001) deixou parte de seu legado no Rio, cidade em que viveu e pela qual era apaixonado. Um enorme painel de azulejos de sua autoria está fixado no muro da Rua Mário Ribeiro, no Leblon, no trecho compreendido entre as avenidas Visconde de Albuquerque e Bartolomeu Mitre. A composição foi feita pelo artista em 1996, a convite da prefeitura da época. Tem 300 metros quadrados e variações de cores e formas geométricas bem ao estilo neoconcreto.

Athos Bulcão

Sem padrão: com apenas um azulejo, Athos Bulcão imprimiu movimento ao painel do Sambódromo Foto: Leo Martins / Agência O Globo
O movimento é uma das marcas registradas de Athos Bulcão em seu trabalho com azulejo. No Sambódromo, na Praça da Apoteose, um painel projetado pelo artista em 1983 ilustra bem esta característica. Com apenas um azulejo ele criou uma forma que não tem padrão.


Djanira

O painel de Djanira foi feito em homenagem aos 18 operários mortos num acidente durante a construção do túnel Santa Bárbara Foto: Ana Branco / Agência O Globo
O Museu Nacional de Belas Artes, no Centro, cuida de uma preciosidade da arte brasileira, retratada na capa desta edição. Trata-se de um gigantesco painel feito por Djanira (1914-1979). As circunstâncias da obra são curiosas e um tanto trágicas. Djanira a fez em homenagem aos 18 operários mortos num acidente durante a construção do túnel Santa Bárbara, no começo dos anos 1960.Com 130m² e mais de cinco mil azulejos, a obra “Santa Bárbara” ficou até meados dos anos 1980 numa capela que existia acima do teto do túnel. Teve de ser retirada por conta da umidade e das infiltrações no local e está no MNBA desde os anos 1990, num pátio com acesso restrito.
Candido Portinari

Segundo o Iphan, existem 47.873 azulejos na totalidade das obras assinadas por Portinari no Edifício Gustavo Capanema Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
Marco da arquitetura moderna brasileira, o Edifício Gustavo Capanema, no Centro, ganhou composições de azulejos à altura do sofisticado projeto para a época. Dois painéis individuais de Candido Portinari são as estrelas da parte externa: um nos pilotis, outro na lateral do prédio. Em tons de azul e branco, o artista reproduziu imagens de peixes, estrelas-do-mar, conchas e sereias, provavelmente pela proximidade do arranha-céu à Baía de Guanabara — no início dos anos 1940, quando foi inaugurado, ainda não havia o Aterro do Flamengo. Apesar de o edifício estar em reforma, é possível apreciar os azulejos de Portinari pela Av. Graça Aranha ou pela Rua Araújo Porto Alegre.

Segundo o Iphan, existem 47.873 azulejos na totalidade das obras assinadas por Portinari no Edifício Gustavo Capanema

 
Adriana Varejão

A
No Centro do Rio, o restaurante Mironga abriga em duas paredes o conjunto de azulejos desenhados pela artista — e que também está no acervo do instituto mineiro. Nesse trabalho, Varejão reuniu ilustrações de 50 espécies de plantas alucinógenas do mundo inteiro. São dois painéis de 2,5 m², com 50 azulejos cada.
O dono do Mironga é irmão da artista, que ganhou os azulejos de presente de aniversário em 200
Roberto Burle Marx
As lavadeiras de Burle Marx no IMS: projeto é de 1949 Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
Beirando o largo de carpas que espelha o céu no jardim do Instituto Moreira Salles - Rua Marquês de São Vicente 476 - , na Gávea, um painel modernista é assinado por Roberto Burle Marx (1909-1994), que, aliás, também projetou o jardim do casarão onde viveu o banqueiro e embaixador Walter Moreira Salles. Burle Marx se inspirou na figura das lavadeiras e nos próprios peixes para conceber o painel , em 1949.

Igreja Nossa Senhora da Saúde

Azulejos portugueses do século XVIII decoram o interior da Igreja Nossa Senhora da Saúde Foto: Gabriela Fittipaldi / Agência O Globo
Situada no alto de uma colina no bairro da Saúde, uma capela em estilo barroco guarda valiosos conjuntos de azulejos portugueses do século XVIII. A Igreja Nossa Senhora da Saúde foi construída por um traficante de escravos em 1742, deu nome ao bairro — que antes se chamava Valongo — e passou por uma minuciosa restauração concluída em 2007. O principal painel de azulejo, colocado na lateral interna da igreja, ilustra episódios da vida de São José no Egito.
Escadaria Selarón

Azulejos do mundo inteiro nos 225 degraus da Escadaria Selarón Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
A Escadaria Selarón, um ícone da Lapa, leva o nome do seu criador, o chileno Jorge Selarón (1947-2013), que, residente ali, começou nos anos 1990 um trabalho de, digamos, customização da escada que liga a Rua Joaquim Silva à Ladeira de Santa Teresa. Lá estão mais de dois mil azulejos, provenientes de diferentes partes do mundo, que Selarón fixou num trabalho incansável pelas paredes e pelos 225 degraus do local. Rua Joaquim Silva, na altura do nº 93.

Temos ainda...

Rio Minho. Aberto em 1884, o restaurante goza do título de mais antigo da cidade. Azulejos portugueses desta época decoram o interior, e um painel fixado nos anos 1970, a fachada. Rua do Ouvidor 10, Centro.

O restaurante Rio Minho é o mais antigo da cidade Foto: Custodio Coimbra / Agência O Globo

Centro Cultural Laurinda Santos Lobo. Antiga residência do General Pinheiro Machado e do senador da república Joaquim da Silva, o casarão de 1907 abriga preciosos conjuntos de azulejaria belga, de tema floral. Rua Monte Alegre 306, Santa Teresa


Azulejos belgas no Centro Cultural Laurinda Santos Lobo, em Santa Teresa Foto: Leo Martins / Agência O Globo

Coletivo Muda. Formado em 2010 por designers e arquitetos, o coletivo faz parte da nova safra de ceramistas brasileiros. Há diversos trabalhos do grupo pelas ruas do Rio. Na foto, uma intervenção que pode ser vista na Barra, no acesso ao Túnel do Joá, sentido São Conrado.

Nova geração: intervenção do Coletivo Muda no Túnel do Joá Foto: Divulgação
Millôr Fernandes. Localizado na Praça Sarah Kubitschek, em Copacabana, o painel de azulejos desenhado por Millôr em 1998 homenageia o frescobol, cria ali da área, e o único esporte “sem vencidos ou vencedores”, como escreveu o jornalista no mesmo mural.
Painel de Millôr Fernandes, em Copacabana, homenageia o frescobol Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

Noel Marinho. Outra lenda da azulejaria brasileira, o arquiteto Noel Marinho trabalhou com Athos Bulcão nos anos 1950, em Brasília. No Rio, uma boa oportunidade para conferir seu trabalho é a fachada do edifício de número 56 na Rua Aníbal de Mendonça, em Ipanema. O projeto é de 1957.


Edifício em Ipanema tem fachada assinada por Noel Marinho Foto: Divulgação

Museu do Açude. O museu tem uma rica coleção de azulejos portugueses dos séculos XVIII e XIX. Em estilo barroco, neoclássico ou rococó, eles estão por toda parte, inclusive em bancos, fontes e na piscina. Estrada do Açude 764, Alto da Boa Vista


Azulejos antigos estão pelas paredes, em fontes, e na piscina do Museu do Açude Foto: Jaime Acioli / Divulgação

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