Sandra Villela Polônia mora na Avenida Delfim Moreira, 558, em frente à praia do Leblon desde que nasceu, quando o lugar era um “bairro de pescadores”, como ela mesma define. Algumas décadas depois, a região é a mais valorizada do Rio, mas Sandra e sua família resistem a seguidas ofertas milionárias pelas casas geminadas de dois andares, construídas pelo avô na década de 1930. São as últimas casas da praia do Leblon, cobiçadas por incorporadores para construir um prédio.
“Dinheiro não compra tudo. Não compra paz, tranquilidade”, afirmou. “Para quê vender a casa? Apartamento nós já temos. Comprar um apartamento de luxo, com o condomínio altíssimo? Não vou morar lá. Meus filhos queriam morar em um apartamento: arrumei um de quatro quartos no Leblon, suíte, vaga na garagem, mas eles ficaram de orelha em pé. Disseram: ‘Ah, a casinha é melhor’. Não têm vizinhos, de dar satisfação a ninguém...”, disse a médica Sandra, casada com Marcos Antonio Lima Polônia, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia.
A construção é simples e não particularmente bela nem grande. Espremidas entre dois prédios, entre as ruas João Lira e José Linhares, as casas brancas e de janelas marrons formam um conjunto só, à primeira vista, embora tenham duas portas de entrada e duas garagens.
O terreno é de 326 m2, mas com a especulação imobiliária, dois especialistas de grandes incorporadoras – que pediram para não ser identificados – estimaram entre R$ 50 mil e R$ 60 mil o valor do m2 naquele trecho da Avenida Delfim Moreira. Isso equivaleria a um montante entre R$ 15 milhões e R$ 19,5 milhões pela área, que poderia ser usada para a construção de um edifício de até cinco andares mais cobertura, um apartamento por piso, de acordo com o gabarito autorizado ali.
Um dos profissionais do mercado imobiliário se surpreendeu ao descobrir que a casa não estava sob restrições de demolição da APAC (Área de Proteção do Ambiente Cultural), medida da Prefeitura do Rio para preservar conjuntos urbanos representativos de diversas fases de ocupação da cidade. No mercado, a casa é tida como "Invendável".
A casa foi construída originalmente nos anos 1930 pelo avô de Sandra, um mineiro de Juiz de Fora que comprou o terreno no então areal do Leblon, fez a casa e depois voltou para a terra natal. Foi uma das primeiras do bairro, diz Sandra. “Ficamos, e o progresso chegando”, diz.
O imóvel, que conserva por fora a aparência original, fica a maior parte do tempo com as janelas fechadas, para evitar a entrada da maresia. As casas funcionam como um elo de ligação da família e serve de lar para três gerações. “Papai não quer vender. Ele e mamãe [filha do construtor] também não querem sair da casa. Somos de uma família mineira, reservada. Chegamos antes do ‘progresso’ do Leblon, quando ainda era um bairro de pescadores. Moro na casa desde que nasci e continuo morando”, afirmou.
Para os moradores do lugar privilegiado, o pior momento desse “progresso” aconteceu nos anos 1970, quando houve obras nos terrenos laterais, por anos seguidos. “Entrava muita barata e rato na casa.”
Satisfeita de ter vista para a praia no bairro nobre do Rio, Sandra preferiria que a casa fosse invisível. “Finge que passou ali e não viu a casa... Que a árvore estava na frente e a escondeu. Queremos ficar em paz, sem ninguém aborrecendo e não ficar em foco”, disse, ao repórter.
FONTE: Rafael Gomide, UltimoSegundo/IG
Olá, cheguei até seu post depois de ver a notícia sobre o prédio que será construído no local.
ResponderExcluirSeria interessante um novo texto a respeito deste feito.
Confesso que fiquei curiosa, mas muito mais triste pelo fato da casinha ter ido ao chão e ter dado lugar à um terreno vazio que será engolido pelo concreto da cidade.
Sinto a história sumindo cada vez mais. É triste.