Hoje, dia 15 de agosto
é dia de Nossa Senhora da Glória.
Houve um tempo que essa data mobilizava a cidade com seus festejos e era motivo de grande alegria, como nos conta o
historiador CHARLES JULIUS DUNLOP, em Crônicas, fatos , gente e coisas da nossa história.
"A tradicional festa de Nossa Senhora da Glória, que se realiza, anualmente, a 15 de agosto, foi um dos grandes divertimentos dos nossos antepassados, constituindo intenso motivo de alegria popular.
Nos últimos anos do vice-reinado, a ela compareciam os vice-reis, os mais altos dignitários da igreja, autoridades, os protetores da irmandade e tudo quanto havia, entre nós, de mais chique e mais elegante.
De 1808 em diante, com o desenvolvimento que tomou o Rio de Janeiro, pela residência efetiva de dom João VI e elevação do Brasil a Reino Unido, a poética igrejinha de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, como todas as instituições da cidade, teve um movimento extraordinário, aviventando o esplendor das festas da padroeira.
No tempo de dom Pedro I e de dom Pedro II, então, esses festejos, com suas romarias e leilões de prendas, atingiram ao auge do seu esplendor, passando o dia da Glória a constituir um dos acontecimentos maiores do ano.
Desde o amanhecer, repicavam os sinos do velho templo, cheio de adoráveis reminiscências, e milhares de devotos e penitentes, levando promessas e empunhando velas de cera enfeitadas de flores de pano e de vistosas fitas, subiam contritos a ladeira.
Por volta das 10 horas, surgia a banda de música dos barbeiros. Seu diretor – informa Melo Morais Filho – era um certo Dutra, mestre de barbeiros na rua da Alfândega, que a ensaiava e fardava para as mais ruidosas funções. Todas as figuras eram negros escravos. Seus uniformes não primavam pela elegância nem pela qualidade: trajavam jaqueta de brim branco, calça preta, chapéu branco alto e andavam descalços. Os que não sabiam de cor a partitura, liam-na pregada a alfinetes nas costas do companheiro da frente, que servia de estante.
Os quarteirões da Glória e do Catete, a essa hora, já formigavam de gente. Bandeiras e galhardetes, colchas de damasco, globos e outros preparos da esplêndida iluminação completavam o pitoresco do sítio, que se animava para os suntuosos festejos. Das carruagens intermitentes saltavam da boléia os criados de libré, descobrindo-se à descida dos altos personagens do clero, das grandes damas da Corte, dos embaixadores, da nobreza, que se dirigiam para o outeiro. De intervalo a intervalo, girândolas e foguetes varavam o ar, estourando prolongadamente. Vendedores ambulantes, com tabuleiros cobertos de panos brancos rendados, tentavam o poviléucom as suas bugigangas ou com quindins e bom-bocados. Nos coretos, executava-se o Hino Nacional. Oficiais e soldados da Guarda Nacional e da tropa de linha destacavam-se dentre o povo, e os batedores do piquete do imperador relampeavam de perto as espadas, abrindo caminho. E suas majestades e altezas, com o seu séquito opulento, apeavam, encaminhando-se rampa acima, subindo os degraus de mármore do gracioso adro, e desaparecendo em breve no profundo da igreja, cujo aspecto era deslumbrante. Terminada a cerimônia religiosa, mesmo depois da retirada da família imperial, a igreja, o largo pátio e a esplanada da ladeira permaneciam apinhados de pessoas.
À noite, sem perder a característica de pompa verdadeiramente real, a festa da Glória interessava mais diretamente ao povo. As luminárias, o templo todo armado e circulado exteriormente de luzes em globos e arandelas, a iluminação da frente de todas as casas da redondeza, os barcos refletindo n’água as luzes de proa, as tocatas de violão, as danças e os leilões de prendas alegravam toda aquela gente que tinha fé e se divertia.
Seguia-se a indefectível queima de caprichosos fogos de artifício em terra e no mar, e o clarão das águas destacava na amurada do cais e na extensão da rua aquela enorme massa de povo, agrupando-se aqui e ali para melhor apreciar o surpreendente espetáculo.
Terminados os fogos, dispersava-se, a pouco e pouco, a multidão, feliz e alegre. Os pomposos bailes nos aristocráticos solares e palacetes das redondezas, no entanto, entravam pela noite até alta madrugada.
Segundo Machado de Assis, a festa da Glória era a Penha elegante, do vestido escorrido, da comenda e do claque; a Penha era a Glória da rosca no chapéu, garrafão ao lado, ramo verde na carruagem e turca no cérebro (cuca cheia)."
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